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sábado, abril 24, 2010

Pedalar é uma cachaça

Quando se destila cachaça o vapor se liquefaz em três etapas, como quase tudo neste mundo. Aliás, a vida é um grande alambique. Primeiro surge a “cabeça”, muito ácida; depois o “coração”, que faz o homem sorrir, e a “cauda” muito tóxica. Em um bom alambique só se torna cachaça a parte nobre, o “coração”, a alma da bebida. Mas a cachaça tomada nos botequins geralmente aproveita tudo e ela desce ardente e o freguês faz cara feia. (as fotos são do fotógrafo João Bosco C Reis)

O mesmo acontece em uma pedalada longa. Começa com euforia, não se percebe o esforço e a paisagem passa ligeira sob a força vigorosa das pernas. Essa parte é quase perdida, é a “cabeça”. Depois de uma hora começa a etapa do “coração”. A adrenalina corre forte nas veias, o coração está feliz, “embriagado”, e a conversa corre solta entre as bicicletas.

Assim foi nesta sexta-feira de São Jorge, 23/04/2010. Saímos para Santa Isabel do Rio Preto e pouco antes entramos à direita seguindo a trilha do Chifre ou da Rocha Negra. O jovem Gilson acompanhava o bate-papo meu com João Bosco. Falávamos de tudo e de todos. Em certo momento comentei o que estou lendo do pensador Arthur Schopenhauer sobre a vida. O filósofo disse em seu livro O Mundo como Vontade e Representação (vol IV) que somos o presente. Não adianta ficar preso ao passado, acontecimentos e pessoas. Tentar reatar uma antiga amizade dá um travo amargo de aguardente ruim. Nem é bom antecipar quem vamos ser. Somos o que estamos vivendo, o jeito que temos neste momento é o que vale, somos o agora.

E a paisagem desfilava devagar diante de nossos olhos ávidos. Coisas belas que a Natureza realizou com forças tremendas. O que é hoje não foi igual há 10.000 anos nem será daqui há outros 10.000. As horas passavam devagar nos dando tempo para cimentar uma boa amizade. Veio o almoço gostoso e voltamos a pedalar.

É hora da “cauda”. O corpo está moído, todos os músculos reclamam, o peito arfa, e só com muito controle conseguimos respirar da maneira certa: profunda, enchendo pulmões e abdome e soltando devagar. Bom se a pedala fosse só o “coração”, a parte boa. Mas, como no dia a dia, “entornamos” a bagaceira misturada, o bom e o mau.

quarta-feira, abril 21, 2010

E quem ouve diga: vem!
Quando comemoramos seis anos de existência do Clube Bike Adventure fizemos uma bela confraternização. Os primeiros adeptos lembraram aquela meia dúzia que se transformou em centenas. No livro O Vendedor de Sonhos dá a quem foi chamado para uma atividade a seguinte missão que nós do Clube Adventure temos obedecido: "Dialoguem com as pessoas. Perguntem, a quem encontrarem pelo caminho, no que lhes podem ser úteis. Não invadam sua privacidade e não controle ninguém. Enxergue-as como elas se vêem. Sejam solidários, generosos e solícitos. Lhes garanto que ambos sairão muito mais humanos e muito mais fortes".
É assim mesmo que me sinto, durante uma pedalada, quando passo por um ciclista e grito: ei, vem com a gente!

segunda-feira, abril 12, 2010

Abrindo nossos caminhos
Em todas as culturas o círculo representa a vida do indivíduo. Dentro dele são pintados seus feitos. Este histórico é preferencialmente denominado mandala. Os acontecimentos marcantes eram desenhados da periferia para o centro, assim tudo que fazemos durante nossa existência influencia nosso final de vida. Jung costumava pedir a seus pacientes para pintar uma mandala pessoal e analisando-a entender o que o afligia. Um dos maiores perigos é nos darmos um xeque-mate, fechar nossos caminhos. Uma velhice abandonada ou dificultada por doenças ou penúria é na maior parte das vezes a colheita do que plantamos. É preciso abrir nossos caminhos.

Mas estou dizendo isto tudo a propósito da pedalada deste domingo, 11/04/2010. Durante a semana encontrei o ciclista Marco com quem andei raras vezes e ele me convidou para um passeio até a represa de São João Marcos. Aceitei, estaria abrindo novas opções, ganhando novos colegas.
Quando entramos em um grupo temos de nos adaptar aos seus costumes e o primeiro, que estranhei é seu hábito de só comer em casa, na trilha é só pedalar. Mas em Arrozal pedi para parar na padaria do Francisco: sei lá quando vou comer de novo!

Bem, íamos atravessar Passa Três e lá, pensei, faço a turma parar na outra padaria, mas estavam na frente e tive de segui-los batido. Subimos sem parar passando por belos lugares, parava para fotografar e ficava para trás. Mas conhecia o caminho. A bicicleta de Marcos quebrou de um jeito que nunca vi, soltou o parafuso das coroas e ficou sem a menor. Mas para ele não era nada, continuava subindo à vontade.

Na represa decidi saltar fora. Anunciei que não ia voltar com eles, preferia fazer a volta por Rio Claro, mas eles resolveram me seguir. Afinal a distância era um pouco menor e a estrada bem melhor. Avisei que depois de subir a serra chegaríamos no bar de D. Rosa onde é servido um belo frango frito, mas ela está desativando o estabelecimento e passamos a refrigerante e biscoito. A fome bateu, Vagner começou a ter cãimbras.

Chegamos em Rio Claro onde os salgados da D. Marlene salvaram a gente. Depois foi pedalar debaixo de chuva fresca e sol ameno. Ganhei novos colegas de pedal, com um jeito diferente, mas é bom conhecer outros costumes, abrir a mandala da gente.