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terça-feira, outubro 27, 2015

Quem deseja voltar para suas poltronas?

Em 31/12/1982 eu e Lili trocamos livros. Ela me deu um livro de psicologia, achando que minha cabeça não estava muito boa, e dei a ela um romance, Ninotchka, do escritor russo Heinz G Konsalik, tentando fazê-la mais suave e menos exigente. Agora, viajando para Barbacena e voltando li-o todo. A história fala dos oficiais militares e nobres que foram deportados para a Sibéria quando de uma revolta deles contra o Czar. Tudo instigado pela Revolução Francesa, era 1825. Foram condenados à 20 anos na Sibéria. Uma pessoa que teve um irmão condenado àquela região disse (p. 49): “Irmãozinhos, a taiga é um inferno. Deus criou a Sibéria para castigar a humanidade. Quem foi mandado para lá, é preferível que se enforque”. Mas os revoltosos foram levados e o mais impressionante da história, suas esposas resolveram acompanha-los ao desterro. Foi uma viagem pavorosa no inverno, com neve se acumulando na altura das casas. Mas chegaram ao acampamento perdido bem longe, depois das montanhas Urais. E o que viram ao chegar lá (p.148)? 

“O rio Olekma corria largo e lento, com a água clara e pura apinhado de peixes. Cervos pastavam na planície verde e martas e arminhos povoavam as florestas. Nas corredeiras os salmões longos e gordos saltavam entre as pedras. O general Globonov disse, arrebatado: E a Europa tem medo disso. Quem é que tem saudades daquele monte de edifícios que é São Petersburgo? Quem deseja voltar para suas poltronas? Eu é que não!”
Assim foi comigo. Cheguei às cinco horas da manhã na rodoviária de Barbacena, troquei de roupa no sanitário, montei em minha bike e saí pedalando pela cidade que dormia. 

Subi até a praça central com as sombras da noite se dissipando 

e desci para o distrito de Campolide 

procurando uma estrada de chão com suas belezas da roça.


Um dia ainda sou capaz de ir pedalar lá na Sibéria. 

domingo, outubro 18, 2015

E para fechar, outra surpresa.

“Todo dia é um dia comum, até o momento em que não é mais”. É assim que começa o sexto livro Crônicas Saxônicas, que meu amigo Luciano Moura me emprestou. 

E assim é quando você pega a bike e sai pedalando. Se está num caminho muitas vezes percorrido a chance de acontecer algo inesperado é quase nenhuma, mas numa trilha desconhecida você se depara com coisas inusitadas a cada curva do caminho.

Assim foi, quando tirei minha bike do bagageiro do ônibus, em Vassouras, e sai pedalando em direção a Massambará. Ali, deixei o asfalto e me embrenhei numa estrada de chão onde nunca dantes passei. Uma placa anunciava um resort com o desafio. Era o que eu queria ler.

Não tive como evitar o hotel de luxo, e nem o queria, pois a estradinha passa em frente a ele. Coisa linda! Um fim de semana espetacular por R$1.400 para o casal, com tudo incluído, mais o que os dois conseguirem inventar.

Segui caminho até encontrar a velha estação e o rio Paraíba do Sul: rolando interminavelmente pelo caminho que ele mesmo abriu até ao mar. 

Então, parei no barzinho e levei um ‘papo amigo’ com o ancião Pascoal, que trata a presidente Dilma de merda pra baixo. Tive de tomar um gole de uma aguardente da região. Aí toquei para Juparanã.
O caminho, beirando o rio Paraíba, parece muito com o trecho depois de Quatis. Mas o inesperado me surge pela frente. Um carcará de metro e meio de envergadura de asa, deixa-me chegar bem perto

e se lança no ar.

Outra visão deslumbrante, uma família catando minhoca para depois ir pescar. Olhei encantado o pai Sérgio fazendo uma coisa desinteressada junto com a esposa e filhos. Duvido que uma compra no shopping fizesse o mesmo efeito.

Outra alegria foi ver, já em Juparanã, a centenária estação ferroviária sendo reformada. Da última vez que aqui estive ela estava desmoronando. 

Uma coisa boa feita pelas autoridades, e porque não dizer, feita pela Dilma!
Aí foi subir bastante, porque para chegar em Valença precisa-se vencer a serra da Concórdia. E já chegando em Valença dei-me um momento para visitar a fazenda Santo Antônio do Paiol.


E para fechar, outra surpresa. Três meninos resolvem me acompanhar quando passo pelo bairro Chacrinha, então os convido para ir comer frango assado no Bar da Galinha. 

Ô pedal cheio de novidade!  

domingo, outubro 11, 2015

Aparecida: oh vem, fica comigo pra nada faltar.

Cada um na sua, a democracia é exatamente isto: dar lugar a todos os gostos.
Mas talvez por ser velho, ontem ao pedalar na Dutra olhava desapontado as dezenas de motos passando ‘voadas’ pelos carros e por mim.

- Zé, teu sonho era todo mundo igualzinho andando de bicicleta.
Meu desapontamento era pelo ser humano que não curte por onde passa e só pensa em onde vai chegar; a volta é a mesma coisa. Andando velozmente cor certeza não dá para abraçar um romeiro, como 'seu' Pedro, de Volta Redonda.

Como estou sempre combatendo uma ansiedade crônica, pedalar é o ideal. Lógico que tenho um objetivo, uma meta a alcançar, um lugar a chegar, mas vou curtindo tudo pelo caminho. 

E mais, pedalando se vive o esforço da subida dura e a alegria da descida vertiginosa.

E foi assim que gastei 10 horas pedalando 150km para chegar em Aparecida. antes de Engenheiro Passos um monumento simples lembra onde Juscelino Kubitschek terminou sua vida laboriosa.

Devia ter ido pela estrada dos Tropeiros, mas isso aumentaria a viagem em 40km e aí não dava para fazer todo caminho num dia só, e ainda participar de uma missa e pegar o último ônibus de volta. Depois de um descidão avisto a Canção Nova, mas ainda faltavam 50km de pedal. 

Aparecida é um lugar de devoção e diversão. Fora do Santuário é um mercado persa, todo mundo tentando lhe vender suas quinquilharias. Um pedaço de abacaxi geladinho.

Como estava só a fim da devoção, subi para igreja velha e atravessei pela passarela empurrando a bike. 

A fé dos pagadores de promessa impressiona.

Aí, fiquei quietinho dentro dos limites do Santuário respirando fé, devoção e muita beleza. 

Durante a missa houve momentos lindos, como quando fiquei engasgado cantando uma canção para Maria que lembra seu papel nas Bodas de Caná:
Maria, Maria, vem pôr Mãe querida,
Jesus, Pão da Vida, na mesa do Altar!
Maria, Maria, sem ti não há festa!
Oh vem, fica nesta, pra nada faltar!


Eu e minha bike no meio da catedral, participando da Eucaristia, cantando e rezando, e recebendo a água benta pra nos proteger no nosso pedalar.