Quando viajava para Florianópolis li muito no ônibus. Um dos arquivos
foi a tese de doutorado de Arthur Bartholo intitulada A Repetição como
Psicologia Experimental, um estudo sobre o pensamento de Soren Kierkegaard.
Na
p. 9, li:
“O segredo da rotação de cultivos é a variabilidade infinita
do finito. O sentido fundante do termo é retirado da agricultura e consiste numa
troca de cultivo dentro do mesmo solo; a ‘ilimitada infinidade de mudança, em
dimensões extensivas limitadas’. Tudo se dá num limite bem definido, e o que
varia propriamente é o método de cultivo e o tipo de colheita; procura-se ‘alívio
do tédio na intensidade antes do que na extensão’. Ao contrário do método no
qual o tédio é vencido por meio do movimento dentro de uma grande extensão, como
o desejo infinito de viajar”.
Percebi lendo isto que ele falava sobre andar de bicicleta.
- Mas zé, Kierkegaard viveu de 1813 a 1855 e a bicicleta foi
inventada em 1870!
Quando se lê um texto a mente da gente aplica a informação
naquilo que mais nos interessa, no meu caso e naquele momento em que viajava
para subir a serra do Rio do Rastro na minha bike, liguei logo a explicação do
professor e do filósofo ao ciclismo.
(na foto, eu, Filipe, Luciano e Fábio - o fotógrafo - estamos indo em direção a Arapeí, SP, passar na fazenda do amigo Fábio, outro; vê se dá pra ficar entediado num visual desses)
Explico-me:
Tenho colegas que fazem o caminho de Volta Redonda à N. Sra do
Amparo, Barra Mansa, duas ou três vezes por semana e não se entediam, fazem-no
com paixão. Eu me cansaria da mesma paisagem e do mesmo trajeto. (que diferença de estar numa academia de ginástica!)
Por isso estou
sempre procurando pedalar em caminhos diferentes, vendo novas paisagens e novas
situações. (este caminho nos levou a Bananal, nenhum de nós ainda havia passado nele)
Kierkegaard ensinou que se pode repetir um trabalho ou uma diversão
muitas vezes sem sentir tédio se ‘variamos a cultura’. É o seguinte: um sujeito tem um
terreno e ora planta feijão ora planta milho, está sempre variando dentro de uma
mesmo terreno limitado.
(nos altos dos morros o horizonte se expande e a gente sente uma liberdade estonteante)
Se não pudesse viajar para andar de bicicleta em outro lugar teria que
pedalar nos mesmos lugares procurando diversificar: os colegas, as conversas, as
horas do dia, as estações do ano. Assim o mesmo caminho me seria sempre
diferente. (você já viu uma arara azul assim, de pertinho?)
E, deste modo, o tédio fica longe.
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